quarta-feira, 11 de abril de 2012

De perfume e amor


E eu pensava sobre o amor...
E um perfume na memória, embalado pelas horas de viagem, na poeira do cerrado enluarado, tremulado de estradas em tantas curvas do nosso bem querer, me tomou.
E chegou assim, na madrugada serena, com a luzes do farol iluminando nosso mundo, acordando a saudade, sacudindo as cobertas na ansia de te esperar na soleira da porta, com os agrados das viagens, das histórias, as roupas sujas, os sonhos de tantas esperanças curados no tempo. E aquele perfume da saudade exalando nas roupas, no suor, no abraço gordo, farto de carinho. Inspirando.
O fogo aquece as panelas da janta do almoço, a refeição sendo feita por todos, o melhor banquete arroz-e-feijão regado na lucidez do seu ollhar. O café quentinho cheira longe, feito pelas mãos da mãe, que coa as esperanças nossas de cada dia, torra com paciência o grão do nosso viver, moe as dores. Não reclama sofrimento. Aquece bemventura.
E os dias, lembro, são todos feito de uma poesia da terra. E a terra falando alto na (a)(h)orta, irrigando as tardes para abrandar o mormaço dos dias difíceis, fazendo arco-iris, o elo, entre a terra, o homem, a mãe e nós.
E crescemos nessa poesia de chão, beijo pra lua, rotas de tantas desilusões e esperanças. E admiramos o céu nosso de cada dia, a beleza do trovão que varre a incerteza de sermos sós,
sertão poeisa, na cadencia do tempo, no veio do riacho que brota aqui, ali, em todo lugar que seu sorriso expande, que seu dedo aponta. E nasce flor de quiabo, coisa mais linda, rompendo o chão e paramos, retidos na mãe poeisa de pai. 
A saudade da sua partida embalada pela vontade amorosa, pelos sonhos de nova morada, nova acolhida, reaviva. E seu cheiro chega sempre antes. O tempero da poeira. O seu cheiro permanece agora. E ainda acordamos sacudindo as cobertas sem saber o que era sonho ou verdade. E tudo o que temos é o caminho aberto pelas tropas e boiadas e cavalos no meio da madrugada cortando os ermos do cerrado, a força do menino que irrompe e desbrava o desconhecido. E tudo é uma história tão linda, é a nossa poesia da vida inteira. O pai que vai. A mãe que fica na esperança de seus filhos. E todos somos esperança nos des-trilhos do seu caminho. E a sua voz ruge ainda agora. E os cheiros de mãepai me entorpecem. E sei que estão aqui. E isso é amor.

2 comentários:

  1. O seu lirismo neste texto é entorpecedor. Seu aroma poético é forte, não a ponto de incomodar, mas de deleitar. Há palavras que ficam tímidas perto do que nomeiam, o que não é o caso das suas, que foram bem escolhidas no pomar da linguagem, onde existem palavras maduras, verdes e podres.

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