sábado, 29 de setembro de 2012

Conjugar sonhos no passado (ou 'das curvas da estrada que não viajei')

arquivo pessoal

Do passeio de sete dias que não fiz comecei não percorrendo cerca de 70km sobre a serra. Não fiquei maravilhada com a paisagem porque eu não vi. Não cantei rindo a música do Roberto na minha versão Kid Abelha (www.youtube.com/watch?v=XVXdzqsYYLc). Não rimos disso também. Quando cheguei, não paseei na Orla nem tomei banho de mar. Mesmo que meu banho de mar se resumisse a molhar os pés, eu não o fiz. Não entendo como posso me encantar tanto com água, o movimento natural e selvagem e lindo e apavorante que as ondas me causam. Não corri nem ao menos caminhei até quase São Vicente sem quase morrer pelo caminho sem fôlego. No Centro Histórico, não fui à Bolsa Oficial de Café. Não fui banhada pela luz que atavessa os seus Vitrais. Não sei sobre o Museu do Café. É triste não sentir o sabor quente do seu café predileto que me atravessa o paladar. O Bonde Turístico ficou parado no mesmo lugar, porque eu não embarquei e, assim, não sei como é o Palácio Saturnino de Brito nem o Outeiro de Santa Catarina. Não tive uma manhã livre para compras, nem senti o sol brando aquecer meu rosto. Também não vi seu sorriso iluminado me mostrando os cantos da cidade que não conheço. Não cansei e não almoçamos no Centro Histórico novamente. Não conheci pratos diferentes nem tomamos aquela cerveja gelada no meio da tarde de encantos que faz a gente rir feito besta depois da segunda garrafa. O Pantheon dos Andradas e Conjunto do Carmo com a igreja mais antiga da cidade nem recebeu minha prece de agradecimento por estar ali ao seu lado. Não vi as reliquiosas Botas de São Joaquim na suntuosa igreja de mármore colorido. (Se não for pecado, claro, fazer trocadilhos com o santo). Penso que o Mosteiro de São Bento deve ser de uma paz daquelas que só consigo em poucos momentos. A arte sacra do museu, não recebeu meu olhar. Eu queria ter rezado na Catedral, me imprescionado com as três naves e, embora não entendesse de santos, os altares em mármore receberiam meu sinal da cruz. Um pouco incrédulo, talvez, mas, com a devoção do olhar que vê pela primeira vez.  
E aquele passeio marítimo de escuna teria sido ótimo com todo o meu medo de água e nossas gargalhadas pelo mesmo medo que me faz ficar boba. Mas eu teria mergulhado se fossemos até o Parque Estadual Marinho. Dizem que a Laje é o melhor lugar de mergulho do país. Dizem. Eu não saberei. E volto para os Jardins da Orla. Como são lindos embora eu não tenha tido tempo de conhecê-los. É que eles florescem e esverdeiam os meus sonhos de há muito tempo e eu quase sinto meus pés tocando toda a natureza no entardecer. Que por-do-sol foi aquele que não vimos nem beijamos? Brindaram-me ao seu lado lírios amarelos e brancos, biris vermelhos que não fotografei nem os crisântemos brancos, amarelos e mesclados. Ah, os Leões eu teria tirado fotos com eles! 
Talvez fosse já o quarto dia de passeio e eu não cheguei até o Complexo Turístico de Monte Serrat, não vi a cidade em 360º e acho que ia ficar com medo do bondinho. Sinto não ter tido tempo de ter medo. Mesmo já tendo chegado às alturas com você em muitos e inesquecíveis e inaugurais momentos. Pinacoteca Calixto, Basílica Menor de Santo Antônio do Embaré, Feirarte. Esta tarde eu não tive. Nem sei se me agradaram. Não entrei nem expurguei os fantasmas com o banho gelado de cachoeira na Fazenda Cabuçu e o trenzinho bonitinho que eu não fotografei da Vila de Itatinga não cantou em meus ouvidos. Esta música eu também não terei ouvido. O Memorial das Conquistas do Futebol, perpetua-se na memória que não tenho e dispenso conhecer a Necrópole Ecumênica. Basta de fins. 
O Aquário Municipal é lindo assim como me emocionou o Orquidário que não visitei nem senti o perfume nem fiz a foto da flor mais sensível. Não fui fotografada nestes dias. Também não nos deixamos tomar pelos risos. Nem vimos, sentados, ao longe estranhas mãos acenando a partida nos navios. Não lembramos daquele poema do Baudelaire que mandei há um tempo em que você queria que seus olhos já cansados vissem como se fossem os meus a ver pela primeira vez. 
Não sei o que vejo entre os Canais 2 e 3. Não senti os cheiros das paisagens da sua memória. Não visitei os lugares das suas primeiras aventuras das primeiras caminhadas que tanto queremos ter visto. Penso que os sete dias de passeios e encantamentos terminam sem terem percorrido toda a serra. Ficam na memória tudo o que também não vivi. 
Lembro de não ler os poemas cravados na praia mas você lembrou de mandar as fotos de Vicente de Carvalho

Velho tema I
Só a leve esperança em toda vida
disfarça a pena de viver, mais nada;
Nem é mais a existência, resumida,
que uma grande esperança malograda
O eterno sonho da alma desterrada
sonho que traz ansiosa e embevecida,
é uma hora feliz, sempre adiada
e que não chega nunca em toda a vida
Essa felicidade que supomos,
árvore milagrosa que sonhamos
toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim: mas nós não a alcançamos
porque está sempre apenas onde a pomos
e nunca a pomos onde nós estamos


Velho tema II

Eu cantarei de amor tão fortemente
Com tal celeuma e com tamanhos brados
Que afinal teus ouvidos, dominados,
Hão de à força escutar quanto eu sustente.
Quero que meu amor se te apresente
- Não andrajoso e mendigando agrados,
Mas tal como é: risonho e sem cuidados,
Muito de altivo, um tanto de insolente.
Nem ele mais a desejar se atreve
Do que merece: eu te amo, e o meu desejo
Apenas cobra um bem que se me deve.
Clamo, e não gemo; avanço, e não rastejo;
E vou de olhos enxutos e alma leve
À galharda conquista do teu beijo.


(Jordanna Duarte ®)