terça-feira, 24 de abril de 2012

A duas dores

Joyce Tenneson
Bird Woman, 1991
e assim,
tudo mudo,
de repente,
muda.

to AG.

O dente-de-leão da dama

image by jose silva
in http://olhares.uol.com.br/dente-leao-foto4350947.html
Com o vento vais? 
Vou-me... leve sem asas... 
Sem sequer com medo, sem paraquedas, 
a flutuar na bruma densa, feito pluma... 
sim, sim: tensa, ora, que de ferro não é a dama 
Sem atalho, dente-de-leão rabiscando com o vento. 
Feito ferro, fere o peito que antes, flutuava sem medo. 
Assim busca, rebusca e rabisca, ao leu, de rouge, o vento fere e a calma, acaricia a alma tua. 
E de leve vai pousando, na pele pousa, pulsando a asa tua. 
Vai de leve, pluma tocando a face rubra. 
Vento vira brisa, vai de leve acariciando. 
Nina alma minha. 
 Assim acariciada, 
repousa amada 
e, suave, 
sonha.

Poema escrito a 4 mãos, em diálogos com Adroaldo Bauer Corrêa .
24/04/2012

sábado, 21 de abril de 2012

O tempo e suas desmesuras

image by Antonio Dias
in http://olhares.uol.com.br/areia-foto2977960.html
E como contar nos dedos o tempo que se passa?
Que se passa junto, que se passa esperando, que se passa no futuro?
E quantos dedos precisamos pra contar o que se esvai em ternuras?
Quanto tempo é que se tem pra contar os dias que fabricam vidas?
E as histórias? O que são 20 anos passados no limite da cama, no limite do desprazer?
E de quantos anos 20 anos são feitos? E quantos flashes se desenvolvem, quantos backs se acendem?
E o que é a vida de 4 anos aprendendo a escrever?
O que são 4 anos nos deslimites das circunstâncias?
E quantas estrelas contamos na sacada do apartamento? 
Quantas fotos tiramos do tempo que se revela em chuva, na árvore seca de folhas que brota azuis?
E quanto tempo ganhamos nos sonhos?
E qual é o tempo em que o trem antigo para na estação francesa? Quanto tempo ele te espera?
E quanto tempo você tem admirando o paraíso?
E quando o tempo se esvai na procurar que não sai do lugar? Quanto tempo você ganha assim?
E os meus dedos dizem quanto tempo estão a procura dos teus?
E o seu som gasta quanto tempo quando atravessa meu coração?
E o tempo diz qual verdade?
Uma semana num outro lugar é um tempo de se contar em dias?
É um tempo que se guarda em segundos? Perfeito? Eterno?
E o seu dia fora do meu compasso é um tempo sem ritmo?
A minha vida sem seu tempo soa silêncio.
E eu já contei a diferença do tempo entre nós e restou: um tempo que teremos.
A espera de um filho é retida no tempo? E a morte se apaga no tempo?
E a vida se faz com quantos anos? Se refaz agora ou se foi com o tempo em que você não estava presente?
Há cidades que se perdem no tempo. Há homens que se perdem no tempo.
Há homens e mulheres que se fazem no tempo. Há homens e mulheres que fazem o próprio tempo.
Há um tempo que não morre jamais. O tempo da espera silente quando não havia nada mais além de você passando no tempo do intervalo. O tempo da espera que começou abril. Porque o ano só iniciou ali. Não há tempo certo para o início.
E o tempo meu é tempo de espera. Quanto tempo? O meu compasso é regido pela sua figura? De quantos tempos é preenchido meu coração por inteiro? E ele quebra em quiálteras. Síncopes. Contratempos. Alternam tempos fortes e fracos. E eu quero o tempo da expressão. 
Minha música é assim. Você sabe ler, sabe entender. Mas não toque no tempo do metrônomo, este, bate o tempo sozinho, solitário inerte em cima do piano. Controle.
Toque minha música com seu tempo interno. O tempo que te faz o que é e você ainda não sabe-se próprio.
Faça nosso tempo como você faz síntese, como você faz espirais de som.Como você faz aquela rua ser minha. Como você faz o tempo da luz na estação e faz som da deusa babilônica. Você faz tempo!
E espere, que o tempo resolve tudo. 
E dele, fica o cheiro do barquinho a vapor, deslizando no litoral do menino que não quer crescer.
Mas venha, porque é tempo. 
E, porque é o tempo, este irá. 
Sem contar? 
Sem esperar?
Escorrendo pelos dedos?

quarta-feira, 11 de abril de 2012

De perfume e amor


E eu pensava sobre o amor...
E um perfume na memória, embalado pelas horas de viagem, na poeira do cerrado enluarado, tremulado de estradas em tantas curvas do nosso bem querer, me tomou.
E chegou assim, na madrugada serena, com a luzes do farol iluminando nosso mundo, acordando a saudade, sacudindo as cobertas na ansia de te esperar na soleira da porta, com os agrados das viagens, das histórias, as roupas sujas, os sonhos de tantas esperanças curados no tempo. E aquele perfume da saudade exalando nas roupas, no suor, no abraço gordo, farto de carinho. Inspirando.
O fogo aquece as panelas da janta do almoço, a refeição sendo feita por todos, o melhor banquete arroz-e-feijão regado na lucidez do seu ollhar. O café quentinho cheira longe, feito pelas mãos da mãe, que coa as esperanças nossas de cada dia, torra com paciência o grão do nosso viver, moe as dores. Não reclama sofrimento. Aquece bemventura.
E os dias, lembro, são todos feito de uma poesia da terra. E a terra falando alto na (a)(h)orta, irrigando as tardes para abrandar o mormaço dos dias difíceis, fazendo arco-iris, o elo, entre a terra, o homem, a mãe e nós.
E crescemos nessa poesia de chão, beijo pra lua, rotas de tantas desilusões e esperanças. E admiramos o céu nosso de cada dia, a beleza do trovão que varre a incerteza de sermos sós,
sertão poeisa, na cadencia do tempo, no veio do riacho que brota aqui, ali, em todo lugar que seu sorriso expande, que seu dedo aponta. E nasce flor de quiabo, coisa mais linda, rompendo o chão e paramos, retidos na mãe poeisa de pai. 
A saudade da sua partida embalada pela vontade amorosa, pelos sonhos de nova morada, nova acolhida, reaviva. E seu cheiro chega sempre antes. O tempero da poeira. O seu cheiro permanece agora. E ainda acordamos sacudindo as cobertas sem saber o que era sonho ou verdade. E tudo o que temos é o caminho aberto pelas tropas e boiadas e cavalos no meio da madrugada cortando os ermos do cerrado, a força do menino que irrompe e desbrava o desconhecido. E tudo é uma história tão linda, é a nossa poesia da vida inteira. O pai que vai. A mãe que fica na esperança de seus filhos. E todos somos esperança nos des-trilhos do seu caminho. E a sua voz ruge ainda agora. E os cheiros de mãepai me entorpecem. E sei que estão aqui. E isso é amor.