foto: Miguel
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Era um final de ano, mais ou menos nessa época, em que conto esta história. Havia uma menina, dessas, que não se acha muito, que não se esconde tanto, mas que se procura bastante. Um dia, quando tentava se descobrir em suas roupas, em suas caixas, achou de se procurar dentro da gaveta. Justo ali, onde todos mexiam, reviravam e não se importavam. Era gaveta mesmo, cheia de bagunça, o que poderia haver ali? Mas a menina teimou, hesitou e tentou... Abriu a gaveta e procurou. Não sabia ao certo o que procurava, mas procurava. E começou a encontrar muita coisa que reconhecia... Descobriu ali, dentro da gaveta, algumas faces do amor. O amor doce, vivido e realizado; o amor escondido por tanto tempo, encontrado e logo perdido.
Achou vozes que lhe ordenavam o caminho, apontavam direções. E achou melhor tirar todas dali. Elas ocupavam muito espaço, faziam muito barulho. E tirou. Ah! Descobriu medos! Quantos! Alguns ela tirou, como o medo de se expor; outros, por medo, deixou. Deixou o medo do escuro, pra ter desculpa de abraçar alguém no meio da madrugada, pra se sentir protegida e pra deixar a vida mais divertida! Tentou tirar as mágoas... Mas elas estavam tão duras lá dentro, que levou um tempão... E a menina sofreu... Sofreu porque não sabia que estava cuidando de mágoas como quem cuida de ervas daninhas, e soube que elas crescem rápido e se espalham mais rápido ainda... Enquanto tirava a bagunça de tantos sentimentos desordenados, descobriu lá no fundo alegrias esquecidas: o prazer de tomar banho de chuva, de correr, de subir em árvore e não dar conta de descer... de comer doce escondida na madrugada! De rir e rir muito... rir do nada, pro nada até ter vontade de chorar... e chorou. E descobriu que rir e chorar fazem parte da vida e que é possível ser simples e feliz (e esse era o seu maior sonho!).
Encontrou pessoas, seu grande tesouro. E sentiu-se feliz em saber que elas existem e que de alguma forma elas existem em sua vida. Algumas erram, e erram feio, em questão de segundos... que outras acertam, às vezes acertam fundo, marcam. E a menina sofreu mais uma vez. Queria que as pessoas chegassem ou partissem num balão de margaridinhas a sorrir, e que nunca, nunca partissem num balão de silêncios...
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